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COM UM LIVRO ESTOU SÓ E BEM ACOMPANHADO
Estar só no silêncio de uma biblioteca ou livraria nos conduz à serena paz de espírito, tão rara em qualquer outro ambiente. “O livro traz a dupla delícia de a gente poder estar só e ao mesmo tempo acompanhado”, – numa oportuna citação do escritor gaúcho Mário Quintana (1906-1994). Sim, o aconchego de um bom livro alimenta a alma.
Ler o que se gosta é um dos grandes prazeres da vida. É bálsamo para as horas de tédio ou de ausência de companhia. O dia termina em conflitos? Ofensas? Socorra se em Montesquieu: “Jamais sofri qualquer mágoa que uma hora de boa leitura não tenha curado.”
Frente às fortes exigências da vida moderna, podemos experimentar duas formas de praticar a benfazeja catarse: nas páginas de um bom livro e nas caminhadas pelos aprazíveis parques da cidade. Sensação de bem-estar provocada pela serotonina. Está provado que tais atividades equilibram os níveis sanguíneos de adrenalina e cortisol.
Inerente ao ato de ler, há o prazer de citar frases dos autores. Assim, complemento o parágrafo anterior com duas citações: “Uma leitura prazerosa é tão útil à saúde como o exercício do corpo” (Emmanuel Kant); “quem lê muito e anda muito, sabe muito e vive muito” (Miguel de Cervantes).
Nos últimos anos, o nosso colégio tem trazido a Curitiba escritores da Academia Brasileira de Letras para palestrar aos estudantes. Depois de um desses eventos, sorvendo um copo de vinho numa mesa de jantar, Nélida Piñon instiga Carlos Heitor Cony:
— A leitura é a coisa mais erótica da vida – provoca Nélida.
— A leitura é o maior prazer da vida, depois daquele outro – complementa Cony com um sorriso maroto.
Adentrar numa livraria ou biblioteca – e eu o fiz em centenas de cidades por este “mundo, vasto mundo” – causa uma volúpia inenarrável. Em suas estantes, cada obra a nos mirar, tal qual a esfinge com os seus enigmas. Instigantes são as palavras do escritor Cristovão Tezza: “Os livros vivem fechados, capa contra-capa, esmagados na estante, às vezes durante décadas – é preciso arrancá-los de lá e abri-los para ver o que têm dentro.” Ou, tergiversando, os livros se parecem a milhares de conchas garimpadas em águas límpidas ou barracentas, da margem ao talvegue. E folhear as suas páginas equivale ao encantamento de abrir cada concha na busca de maravilhosas pérolas entre moluscos e nácares.
Concluo parafraseando Jorge Luís Borges (1899-1986), ao imaginar uma biblioteca como uma espécie de paraíso. É um espaço de enlevo, democrático e ao mesmo tempo mágico, pois quem lê desenvolve a boa escrita, a oralidade, a análise crítica, o pensamento autônomo, a abstração e a imaginação.
Jacir J. Venturi É diretor de escola e autor de livros. Foi professor da UFPR e PUCPR.