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Escola em tempo integral para uma educação integral
Jacir Venturi
O Brasil é um dos países mais desiguais do mundo, tanto na área econômica como na social, e continuará sendo enquanto a oferta da educação de qualidade permanecer desigual. Jamais ultrapassaremos os umbrais da mediocridade, sem oportunidades iguais de acesso a um ensino de qualidade para todas as crianças e adolescentes. Por isso, termos as escolas funcionando em período estendido é uma das poucas, quase-unanimidades, como demonstram diversas pesquisas. Em 2022, mais de 75% de pais e alunos entrevistados pela Quaest Consultoria, em todo o território nacional, manifestaram o desejo de ter seus filhos em uma escola que ofertasse o ensino em tempo integral.
De fato, há o reconhecimento por parte da maioria dos educadores, autoridades, pais e alunos de que o período integral na escola oportuniza um melhor preparo para o desenvolvimento das crianças, os exames oficiais e/ou o mercado de trabalho, quando da opção por cursos técnicos. Consideram que é significativa a redução da evasão, abandono e reprovação. E há outros motivos que justificam a oferta ampliada: merenda, maior segurança, especialmente pelo afastamento da violência e das drogas, menor índice de gravidez precoce.
Neste sentido, podemos mencionar as experiências exitosas e comprovadas, vivenciadas no estado de Pernambuco, que em 2007 padecia com um dos piores desempenhos no Ensino Médio, ocupando a 21ª posição no IDEB (principal indicador de qualidade da educação brasileira). Desde então, implantou a extensão da carga horária para 7 horas ou mais no Ensino Médio e alcançou, em 2021, a 3ª posição, sendo atualmente, em regime de tempo integral, 62,5% dos colégios pernambucanos do segmento.
Nessa direção, há poucos dias, em 31/07/23, foi sancionada a Lei do Programa Escola em Tempo Integral, tema que mereceu uma aprovação ultrarrápida no Congresso. Será coordenado pelo MEC, por meio de um mecanismo federal de fomento financeiro e assistência técnica à expansão das matrículas nas redes municipais e estaduais, cuja adesão é opcional. Uma escola é considerada em tempo integral se o estudante permanecer na instituição pelo menos durante 7 horas diárias. Evidentemente, os custos são mais elevados (cerca de 65%) em comparação aos custos de um período de apenas um turno.
Serão disponibilizados, pela União, R$ 4 bilhões para melhorias na infraestrutura aos estados e municípios que aderirem voluntariamente ao Programa, pois o novo modelo vai exigir que se amplie ou que se reconfigure o espaço físico. E o MEC também se propõe a dar assistência técnica às redes de ensino para a formação de educadores, orientação para uma nova matriz curricular e fomento a projetos inovadores. É indispensável que o MEC implante indicadores de avaliação para esse Programa, que divulgue as boas práticas e as matrizes curriculares bem-sucedidas.
A meta é efetivar um acréscimo de 3,6 milhões de matrículas até o final de 2026. O vigente Plano Nacional de Educação (PNE) estabelece que se matricule 25% dos alunos da Educação Básica em período integral até 2024 (estamos defasados, pois em 2022 alcançamos apenas 14,4%). E a extensão para o período integral não precisa ser implementada simultaneamente em todos os segmentos, podendo ser, por exemplo, apenas para a Educação Infantil, numa primeira etapa, e depois para o Ensino Médio, em outra etapa.
A escola em tempo integral deve ser, na sua acepção correta, uma educação também integral, holística (quando se consideram as diferentes áreas do desenvolvimento: intelectual, emocional, social e psicológico). Que vá além do ensino formal, em especial na escolha de componentes curriculares eletivos, com ênfase especial para o Projeto de Vida. E é aí que reside boa parte das críticas, pois não se deve fazer à tarde mais do mesmo que já é feito pela manhã, como ocorre atualmente em muitas instituições de ensino, nas quais predominam exageros de aulas de reforço, excessos de tarefas, leituras maçantes, brincadeiras sem intencionalidade em pátios, longo tempo em frente às telas, e tantos mais. Dessa forma, a escola se torna monótona, cansativa, chata, um mero depósito de crianças ou adolescentes. Esse é um grande desafio, e demanda uma boa gestão dos administradores escolares para fazer a diferença.
O acompanhamento e a cobrança do MEC serão essenciais, pois são tantos os exemplos no Brasil de programas bombásticos, anunciados com pompa e gala, e que apenas resultam em gastança desbragada. Contudo, mantenhamos a esperança de que dará certo, embora reconheçamos que o desafio da prática é hercúleo. Agora, com a força de uma Lei, não mais com fulcro em portarias, o nosso otimismo se exacerba com a promessa do MEC de empreender um trabalho em regime de colaboração entre os entes federados.
Sobre esse tema, nada mais consentâneo que as palavras de um dos maiores intelectuais da atualidade brasileira, Eduardo Giannetti, quando de sua posse na Academia Brasileira de Letras em 2022: "A queda da taxa de fecundidade no Brasil provoca uma grande mudança na pirâmide etária, o que pode ser positivo para a educação. Com a perspectiva de menos crianças no sistema de ensino, a tendência é ter mais folga de recursos para investir em escolas de tempo integral e capacitação de professores".
Jacir J. Venturi, membro do Conselho Estadual de Educação do Paraná, foi professor e gestor de escolas públicas e privadas, da UFPR, PUCPR e Universidade Positivo. Autor de 4 livros.